segunda-feira, 19 de julho de 2010

MÚSICA E POESIA NO LEITO DO HOSPITAL


MÚSICA E POESIA NO LEITO DO HOSPITAL

         Para viver, Merlânio Maia vende planos de saúde. Mas, em suas horas vagas, prefere levar sua arte para quem quase não tem saúde. Músico e poeta popular, preservador da culturamatuta”, este espírita, formado em Filosofia encanta, com poesia e violão, os pacientes do Hospital Napoleão Laureano, a mais importante Instituição para tratamento do câncer na Paraíba.

         - Eles vêm de sítios e fazendas do interior, na maior parte das vezes com câncer de pele adquirido no trabalho de sol a sol. Ficam semanas, às vezes meses. Sou sertanejo, vivi a seca, conheço bem o problema desse pessoal. A gente tenta ter um papo aberto, conversar sobre todas as dificuldades da vida deles, que são pessoas carentes em todos os sentidos – afirmou o poeta nascido em Itaporanga, alto sertão paraibano.

Toda segunda-feira à tarde, Merlânio pega seu chapéu colorido, o violão e os livros de cordel e parte para o hospital, um dos maiores de João Pessoa. A expectativa por sua chegada é grande. Durante a semana, os doentes vão colecionando poesias para serem declamadas ou musicadas na hora pelo artista.

         Um jovem uma vez me disse que o melhor dia da semana, para ele, era a segundafeira, quando a música e a poesia chegavam ao hospital – disse o filósofo.

         Uma das maiores emoções de Merlânio foi ver um homem idoso pegar seu violão e, com aqueles dedos calejados e encarquilhados, bater nas cordas com a dificuldade de quem não tocava há algumas décadas.

         - Ele disse que havia tocado violão quando era rapaz. Ainda sabia solar algumas melodias. Ficou numa alegria muito grande por ter tocado violão tanto tempo depois. É muito gratificante ver que nosso trabalho melhora a qualidade de vida de alguém – disse o artista.

         Merlânio, segundo suas próprias palavras, “trabalha o lado lúdico da arte”. A partir das poesias e das músicas – num esforço acompanhado também por psicólogos -, ele conversa com os enfermos sobre suas angústias e problemas, sobre a doença e as dificuldades da vida no hospital.

         Lembra-se de uma vez em que conversava com um grupo de pacientes sobre a importância do ato de perdoar, de não guardar rancor.

         - Uma senhora, com idade avançada, disse que não perdoava determinado desafeto que, numa certa ocasião, tinha batido na filha dela. Daí eu disse a ela que, com a raiva, a gente acaba guardando muita coisa ruim, muita coisa que a gente deveria jogar fora. Ela nada falou. Apenas começou a chorar. Então sem uma palavra, veio até mim e me deu um abraço. São momentos de alegria muito grande – afirmou.

         Buscar nessas pequenas recompensas, o estímulo para dar continuidade a seu trabalho é um dos trunfos que Merlânio Maia guarda para vencer as dificuldades de ser um artista voluntário em um hospital especializado em oncologia. Uma das maiores, diz ele, é manter sempre uma mensagem positiva e de alegria para quem, muitas vezes, está sem esperança.

- É difícil manter os meninos motivados. vi pessoas que queriam ser voluntárias cair em choro convulsivo quando viram as crianças mais graves. É importante sempre manter um caráter de otimismo – diz o artista, que sempre abraça os pacientes.

Para Merlânio, foi fundamental, em sua decisão de praticar um trabalho voluntário, os ensinamentos de Allan Kardec. O pai do Espiritismo ressalta a importância de se praticar a caridade incessantemente.

- Como eles, sou um viajante do Universo. Todo mundo está no mesmo barco, e temos que nos ajudar uns aos outros – disse o poeta, que deve publicar este ano na capital paraibana dois livros infantis, uma outra faceta do seu trabalho.
(Merlânio Maia é poeta e músico popular, há 7 anos trabalha com pacientes portadores de câncer no Hospital Napoleão Laureano em João Pessoa-PB)
(Capítulo do Livro: “CRONICAS DE UM GESTO VOLUNTÁRIO”, Autores Taisa Ferreira, Lúcia Leão, João Paulo Tupynambá, Edição MINISTÉRIO DA SAÚDE, Brasília, 2001, pág. 86-87)

         

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